terça-feira, 28 de agosto de 2007

Réco-réco, Bolão e Azeitona

Conversando com um colega sobre variedades, este citou "Réco-Réco, Bolão e Azeitona". Confesso que tinha uma lembrança muito vaga, talvez fruto de alguma citação de meu pai. Esse mesmo colega fez uma breve pesquisa na internet (vivas para o Google), chegando ao site Invivo, do Fiocruz, onde foram publicados alguns trabalhos de Luiz Sá, autor desses personagens. Achei muito interessante, e resolvi dar uma "palhinha" aqui, no PENSAMENTO DIVERSO. Vale a pena visitar, pois conta um pouco da história desse cartunista, além de apresentar outros trabalhos.
Aproveitem (clique na imagem pra ver no tamanho original)...

Quando o pensar é crime...

Esta mensagem copiei inteira do Diário Gauche.
Porquê? Porque tortura é um assunto sério e pouco comentado no Brasil; porque muito têm se falado em ditadura, mas pouco se conhece; porque mente-se falando em "revolução de 64", quando na realidade foi um duríssimo golpe CONTRA a democracia; e porque essa atual geração de jovens (felizmente) não conhece as barbaridades que ocorreram há pouco tempo em nossa nação, com a absoluta conivência dos principais meios de comunicação de massa ainda vigentes no país. Meios de comunicação esses que sensibilizam-se (legitimamente) com as vítimas do vôo da TAM (creditando uma suposta responsabilidade pelo acidente ao governo), mas que por tanto tempo, e ainda, encobriram o terror que castigou tantos seres humanos cujo grande crime foi exercer seu direito ao pensamento livre, ao pensamento diverso.
Tortura, NUNCA MAIS!

Terça-feira, 28 de Agosto de 2007

A cumplicidade entre a mídia e a repressão

O relato abaixo serve para demonstrar a ação combinada e orgânica entre a repressão da ditadura militar de 64 e os órgãos da mídia oligárquica no Brasil.

O assassinato de Eduardo Collen Leite, o “Bacuri” é um dos mais terríveis dos que se tem notícia, já que as torturas a ele infligidas duraram 109 dias consecutivos, deixando-o completamente mutilado. Quando o corpo foi entregue aos familiares estava sem orelhas, com olhos vazados e com mutilações e cortes profundos em toda a sua extensão.

Foi preso no dia 21 de agosto de 1970, no Rio de Janeiro, pelo delegado Sérgio Fleury e sua equipe, quando chegava em sua casa. Passou pelo CENIMAR/RJ e DOI-CODI/RJ, onde foi visto pela ex-presa política Cecília Coimbra, já quase sem poder se locomover.

Do local da prisão, Eduardo foi levado a uma residência particular onde foi torturado. Seus gritos e de seus torturadores chamaram a atenção dos vizinhos, que avisaram a polícia. Ao constatarem de que se tratava da equipe do delegado Fleury, pediram apenas para que mudassem o local das torturas.

Após ser torturado na sede do CENIMAR, no Rio de Janeiro, Eduardo foi transferido para o 41° Distrito Policial, São Paulo, cujo delegado titular era o próprio Fleury.

Novamente transferido para o CENIMAR/RJ, Eduardo permaneceu sendo torturado até meados de setembro, quando voltou novamente para São Paulo, sendo levado para a sede do DOI/CODI. Em outubro, foi removido para o DOPS paulista, sendo encarcerado na cela 4 do chamado “ fundão” (celas totalmente isoladas).

No dia 25 de outubro, todos os jornais do País divulgaram a nota oficial do DOPS/SP relatando a morte de Joaquim Câmara Ferreira (Comandante da ALN), ocorrida em 23 de outubro. Nesta nota, foi inserida a informação de que Bacuri havia conseguido fugir, sendo ignorado seu destino. Foi encontrado nos arquivos do DOPS, a transcrição de uma mensagem recebida do DOPS/SP pela 2ª seção do IV Exército, assinada pelo coronel Erar de Campos Vasconcelos, chefe da 2ª Seção do II Exército, dizendo “que foi dado a conhecer a repórteres da imprensa falada e escrita o seguinte roteiro para ser explorado dentro do esquema montado”. O tal roteiro falava da morte súbita de Câmara Ferreira após ferir a dentadas e pontapés vários investigadores. E mais adiante diz “Eduardo Leite, o Bacuri, cuja prisão vinha sendo mantida em sigilo pelas autoridades, havia sido levado ao local para apontar Joaquim Câmara Ferreira (...) Aproveitando-se da confusão, Bacuri, (...) logrou fugir (...)”. Estava evidenciado o plano para assassinar Eduardo Collen Leite.

O testemunho de cerca de 50 presos políticos recolhidos às celas do DOPS paulista (entre eles, o gaúcho Ubiratan de Souza, da VPR) neste período prova que Eduardo jamais saíra de sua cela naqueles dias, a não ser quando era carregado para as sessões diárias de tortura. Eduardo era carregado porque não tinha mais condições de manter-se em pé, muito menos de caminhar ou fugir, após dois meses de torturas diárias.

O comandante da tropa de choque do DOPS/SP, tenente Chiari da PM paulista, mostrou a Eduardo e a inúmeros outros presos políticos, no dia 25, os jornais que noticiavam sua fuga.

Para facilitar a retirada de Eduardo de sua cela, sem que os demais prisioneiros do DOPS percebessem, o delegado Luiz Gonzaga dos Santos Barbosa, responsável pela carceragem do DOPS àquela época, exigiu o remanejamento total dos presos, e a remoção de Eduardo para a cela n° 1, que ficava defronte à carceragem e longe da observação dos demais presos. Seu nome foi retirado da relação de presos, as dobradiças e fechaduras de sua cela foram lubrificadas de forma a evitar ruídos que chamassem a atenção.

Os prisioneiros políticos, na tentativa de salvar a vida de seu companheiro, montaram um sistema de vigília permanente.

Aos 50 minutos do dia 27 de outubro de 1970, Eduardo foi retirado de sua cela, arrastado pelos braços, pela falta total de condições de pôr-se em pé, com o corpo repleto de hematomas, cortes e queimaduras, sob os protestos desesperados de seus companheiros. Segundo testemunho de Ubiratan, todos os presos chegaram junto às grades e estendiam braços e mãos para cumprimentar ou simplesmente tocar em Bacuri, ao mesmo tempo que vibravam talheres e copos metálicos no ferro das grades numa demonstração de protesto pela iminente morte de um companheiro. Todos sabiam que Bacuri seria executado.

Eduardo não foi mais visto. Os carcereiros do DOPS, freqüentemente questionados sobre o destino de Bacuri, só respondiam que ele havia sido levado para interrogatórios em um andar superior. Os policiais da equipe do delegado Fleury respondiam apenas que não sabiam; apenas o policial conhecido pelo nome de Carlinhos Metralha é que afirmou que Eduardo estava no sítio particular do delegado Fleury. Tal sítio era usado pelo delegado e sua equipe para torturar os presos considerados especiais ou os que seriam certamente assassinados e, por isso, deveriam permanecer escondidos.

No dia 8 de dezembro, 109 dias após sua prisão, e 42 dias após seu seqüestro do DOPS, os grandes jornais do País publicavam nota oficial informando a morte de Eduardo em “um tiroteio nas imediações da cidade de São Sebastião”, no litoral paulista. Era evidente o conluio entre a repressão e a mídia, nesta farsa montada para eliminar Eduardo Leite.

A notícia oficial da morte de Eduardo teve um objetivo claro: tirar as condições da inclusão de seu nome na lista das pessoas a serem trocadas pela vida do Embaixador da Suíça no Brasil, que havia sido seqüestrado no dia 7 de dezembro. Seu nome seria incluído nessa lista e seria impossível soltar o preso Eduardo que, oficialmente estava foragido e, além do mais, completamente desfigurado e mutilado pela tortura.

As informações são do grupo Tortura Nunca Mais e de Ubiratan de Souza. A fotografia é do monumento Pau-de-arara de Recife, em memória dos que sofreram com a ditadura militar de 1964.

E para que serve a comunicação?

"E para que serve a comunicação?
Serve para que as pessoas se relacionem entre si, transformando-se mutuamente e a realidade que as rodeia" - Juan E. Diaz Bordenave


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segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Vai um panfletinho aí?

A situação da "mídia guasca" (como costuma referir-se o Cristóvão Feil do blog Diário Gauche) é cada vez pior. Que aproveite-se textos prontos, de qualidade e conteúdo é prática comum e até certo ponto desejável entre os blogs, desde que dada a referência, como tenho feito aqui no PENSAMENTO DIVERSO. Mas por vezes deparamo-nos com constatações aterradoras, uma das quais tentarei relatar por aqui.
Acompanho regularmente a página de comunicação da prefeitura de Porto Alegre, destacando certos assuntos que são de interesse dos municipários e dos cidadãos. Com esse objetivo reservei uma matéria sobre os "Portais da Cidade", projeto megalomaníaco idealizado pelo governo Fogaça que trará, se executado, repercussões desconhecidas (e, em vários prognósticos, bastante nocivas) à morfologia urbana e à economia das áreas afetadas. Paralelamente a essa consulta, recebo "clippings' enviados pela assessoria de comunicação do SIMPA, sindicato ao qual sou filiado. Pois hoje pela manhã, ao ler esse "clipping" referente ao sábado deparo-me com texto conhecido, porém publicado no jornal "O Sul": o mesmo texto, a mesma foto e praticamente mesmo título, numa clara prática que chamamos atualmente de "copy & paste", ou "recorta e cola". Um jornal de grande circulação não deveria sujeitar se a esse papel de mero divulgador das versões oficiais, e sim realizar uma investigação, algum trabalho de campo e pesquisas, ou seja, deveria funcionar no sentido de informar os cidadãos, e não simplesmente reproduzir uma nota oficial, publicada em página oficial da PMPA, transformando-se assim em um mero panfleto, de valor jornalístico bastante questionável; ao menos se fizesse referência à fonte, já que não é exclusiva e tampouco isenta, resguardaria algo da credibilidade. Abaixo os insiro os textos para os leitores terem a oportunidade de comparar:



24/08/2007

Foto: Ivo Gonçalves / PMPA
Representantes do BID visitam o terminal Azenha

TRANSPORTES

Missão do BID vistoria os futuros Portais da Cidade

Os representantes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) Felipe Targa e Paulo Carvalho dedicaram a manhã de hoje, 24, para visitas aos locais onde serão construídos os três grandes terminais de integração que fazem parte do projeto Portais da Cidade.

Acompanhados do diretor de transportes da EPTC, Fernando Dutra Michel, e do consultor do projeto, Marco Kappel, vistoriaram os terminais Azenha e Cairu, onde hoje já funcionam estações de transporte coletivo, e o Largo Zumbi/Açorianos, que deverá abrigar o terceiro Portal. Os três espaços foram considerados apropriados para serem transformados em Portais e, ainda, podem contribuir para revitalizar áreas próximas.

A missão do BID está em Porto Alegre para definir os termos da cooperação técnica que será firmada com a prefeitura para o desenvolvimento desse projeto, que prevê um novo sistema de circulação e transporte para o centro da Capital. O BID destinará 500 mil dólares para estudos de detalhamento e qualificação do projeto. Na conclusão dos trabalhos, Esteban Diez, da divisão de finanças e infra-estrutura do banco, expôs as novas linhas de financiamento disponibilizadas, acenando com a possibilidade de um investimento maior no projeto, com contrapartidas da iniciativa privada e da prefeitura.

Para o secretário de Gestão e Acompanhamento Estratégico, Clóvis Magalhães, o resultado da missão foi positivo. "Consolidamos as informações requeridas pelo BID e mostramos que o projeto é viável e vai mudar a face do centro da cidade." Agora, o banco vai contratar uma consultoria internacional para realizar os estudos técnicos que resultarão no edital de licitação para o parceiro privado. A previsão é de que o edital seja lançado até o final do primeiro semestre de 2008.


Recorte enviado pela Kad - Comunicação Integrada (assessoria de imprensa do SIMPA):


Vamos pautar a grande imprensa?

Reproduzo texto do Animot, que deve ser de conhecimento a todo o blogueiro, jornalista e formador de opinião comprometido com o fortalecimento de nossa sociedade:

A grande imprensa vencendo mesmo quando está perdendo

A grande imprensa vem perdendo clientes e credibilidade. Isso é importante. No entanto, a grande imprensa ainda vence em um quesito fundamental, a formação da pauta de notícias e de debates. Isso ficou claro nos casos da invenção de crises aéreas e na transformação de um espetáculo em "movimento apolítico", o oximoro. Para ver como a grande imprensa ainda está vencendo nesse quesito fundamental é só ler os blogs políticos em geral, não importando a tendência dos mesmos. Para derrotar a grande imprensa é de primeira importância esvaziar as pautas por ela propostas, e isso só pode ser feito:

(1) deixando de usar a grande imprensa como fonte de informação (o que é racional, pois ela não é confiável), (2) adotando fontes de informação confiáveis (listarei algumas abaixo) e, principalmente, (3) produzindo a diferença, criando pautas sobre temas realmente importantes.
Sem isso a esfera pública permanecerá viciada pelas idéias oligárquicas da grande imprensa. (1) Então vamos lá. É preciso deixar de consumir produtos da grande imprensa. Isso quer dizer não comprar a mídia (papel, sinal eletrônico etc.), e principalmente não consumir a idéia por ela apresentada. É mais importante evitar as idéias (teses, pautas, "notícias") da grande mídia do que os veículos das idéias, os quais servem para embrulhar (no caso do papel dos jornais) ou para alterar as células do nosso corpo (no caso do sinal eletrônico). Ou seja: não leia, não ouça, não veja e principalmente não retransmita as idéias (os memes) da grande imprensa oligárquica. Assim os derrotamos pela fome, pois idéias (memes) parasitam mentes; sem mentes disponíveis, elas desaparecem. (2) Reproduzo abaixo algumas ótimas fontes de informação confiável que são consumíveis sem risco para a ecologia mental do cidadão. Sobre o Brasil: - agência Carta Maior - revista CartaCapital - Portal do Mundo do Trabalho - jornal Brasil de Fato - sítio Vi O Mundo Sobre o RS: - blog RS Urgente - EcoAgência Também há formadores de opinião respeitáveis. Eis alguns: - Mino Carta - Alon - Luis Nassif - Paulo Henrique Amorim Além disso há toda a blogosfera usualmente enlaçada por aqui e disponível para visitação aí na lateral esquerda. (3) Por fim, é preciso produzir a diferença, criar a própria pauta, e propô-la aos outros, seja para a adoção, seja para a crítica, seja para a apropriação crítica e interpretada da mesma. Isso é o mais difícil, nem sempre dá certo, exige maturidade ante as frustrações, mas há meios de se alcançar:
  1. só confie em fontes que deixam claro que idéias e interesses defendem, e veja se a fonte realmente defende as idéias e interesses que declara defender;
  2. não forme uma opinião sobre um tema antes de ouvir atentamente ao menos uma fonte confiável;
  3. desconfie de todas as informações fornecidas por uma fonte enganadora;
  4. coloque cada notícia no seu quadro mais geral (para isso você precisará ler textos que explicam o quadro mais geral, como os de Noam Chomsky);
  5. lembre sempre que a justiça social (mesmo segundo teorias liberais como a de John Rawls) está em distribuir mais frutos dos impostos aos cidadãos menos favorecidos, e em onerar com mais impostos os cidadãos mais favorecidos.

Vitória pra quem, cara pálida?

Reproduzo aqui texto enviado pela Cláudia, do Dialógico, cujo conteúdo me parece extremamente coerente, e reflete minha opinião sobre o tema. Acompanhe:

Sem mudar a estratégia, o que muda?

Alipio Freire


O autodenominado "Campo Majoritário" - CM (ou que nome fantasia queira adotar - pois trata-se de prática já absolutamente "legitimada" do ponto de vista mercadológico desde que o PFL transubstanciou-se em DEM) criou a idéia, que pretende consensual, de que o projeto que impôs e capitaneou desde os anos 1980, e que culminou com os dois mandatos presidenciais, é um projeto vitorioso. A questão, de tão singela, é cansativa. Até os tontos percebem: Vitorioso para quem, cara-pálida? A política produzida e gerenciada pelo "Campo Majoritário" e suas principais lideranças, vista a partir do que sugere a pergunta, só conduziu os trabalhadores e o povo a uma fragorosa catástrofe: a descaracterização política (de classe), por poucos, de um instrumento de luta indispensável, e cuja construção custou o esforço de tantos. O Terceiro Congresso, é preciso que fique claro, acontece meio a uma estrondosa derrota do PT (enquanto partido), se temos como referencial de avaliação um partido de trabalhadores enquanto ferramenta política de conquistas dessa classe, o que, na realidade brasileira e internacional, hoje, implica ser capaz de avançar ou pelo menos de sinalizar na direção de mudanças estruturais de interesse da classe que diz/pretende representar. E mudanças estruturais para uma agremiação onde todas as correntes reafirmam, em suas 12 teses (inclusive o CM), a questão do "socialismo democrático", implica necessariamente discutir a questão das relações de propriedade, e da concentração de riquezas. Ou é isto, ou não há por que falar em socialismo. Ou é disto que falamos, ou mergulhamos todos no perigoso terreno da empulhação e da galhofa. A estratégia perseguida desde sempre pelo PT-CM define enquanto terreno principal para travar suas lutas, as instâncias institucionais, partindo do princípio de que, para a realização das mudanças estruturais (supondo que em algum momento o CM tenha querido fazê-las, mas não de todo convencido a este respeito) passa pela conquista do Governo - da Presidência da República. Objetivo enunciado ambiguamente, ora como "chegar ao Governo", ora como "chegar ao Poder", ambigüidade quase nunca inocente, mas que, se inocente, revelaria por si mesma a falta de preparo de suas lideranças para formular políticas. Mas, se falamos a sério, a incompetância na formulação da estratégia é mais grave que a ambigüidade acima apontada. Ainda supondo, apenas para efeito do raciocínio abstrato, que o CM tem a intenção de proceder as tais mudanças estruturais, o mais espantoso e estarrecedor é a própria definição do terreno principal de luta: a instituição - onde o inimigo é o mais forte. Reza um velho princípio da arte da política e da guerra, que devemos sempre procurar trazer o inimigo para combater no terreno onde somos (ou podemos vir a ser) os mais fortes, subordinando as lutas em outras frentes às necessidades de avanço e consolidação das lutas travadas no terreno definido como principal. Pelo menos no contexto que vivemos, nos parece óbvio que o nosso terreno privilegiado de luta são as ruas e as praças, ou seja, o da organização e expressão do povo organizado, dos trabalhadores reunidos em suas organizações classistas autônomas e independentes, sejam de caráter sindical, de bairros etc.. E a estratégia do PT-CM inverte a equação. Quanta incompetência! - é a primeira expressão que nos ocorre: colocar o centro da luta no terreno onde a classe trabalhadora e o povo são mais fracos, subordinando o desenvolvimento das organizações e lutas de massa aos interesses da instituição controlada por adversários e inimigos. As classes dominantes são dominantes e exercem sua hegemonia porque estão capilarmente organizadas (nas empresas, em associações e sindicatos patronais, em partidos, clubes rotarianos e outras maçonarias, etc.). Disputar poder, disputar hegemonia é disputar a capacidade de construir essa capilaridade organizada. Não é possível imaginar que, abandonando a tarefa de construir e fortalecer as organizações (e movimentos) independentes dos trabalhadores e do povo, seremos capazes de disputar, para além da formalidade dos cargos conquistados nas instituições, a condução dos destinos políticos da República. Esclareço, disputar enquanto classe o destino político da República. Mas foi sob a batuta dos dirigentes do CM, que o PT conseguiu a proeza de eleger um governo democrático e popular em pleno refluxo dos movimentos e organizações dos trabalhadores e do povo, contrariando tudo o que ensina desde sempre a história política (e política é a luta das classes, frações, setores, segmentos de classes na defesa e disputa dos seus interesses). Ou seja: o Partido dos Trabalhadores chega à Presidência da República sem movimentos populares fortes, sem a classe trabalhadora em cena. Mistério! - logo pensamos, abandonando os saberes acumulados a respeito do assunto e nos entregando às especulações mágicas, ou às tortuosas teorizações ad hoc, para justificar o "milagre" - há sempre um que outro teórico de plantão para o malabarismo circense do circular em torno do "poder" a qualquer preço, ainda que depois de usado e alijado se arrependa. Descartada portanto a necessidade de firmar alianças com as bases que, organizadas, são o sujeito das transformações estruturais supostamente almejadas, e sem o concurso das quais nada acontecerá nessa direção, passa-se ao novo capítulo, garantir a governabilidade. Mas as bases originais do PT - os trabalhadores organizados da cidade e do campo - não estão desorganizadas e/ou enfraquecidas apenas em conseqüência das transformações no mundo do trabalho, e o desconhecimento de como aquele se reorganizou - indústria de justificativa para a inércia e atrelamento político da parte de muitos dirigentes, e que já se repete há duas gerações de trabalhadores. Acontece que na lógica eleitoreiro-institucional que preside a estratégia definida pelo CM, não são essas antigas bases que, organizadas, se fizeram sujeito político e fundaram o PT, que contam. No projeto do CM, não apenas não interessam, como atrapalham. O caminho foi cooptar o que poderia ser cooptado no nível de suas direções e abandonar "o resto" à sua própria sorte, ou à Reforma Trabalhista que se anuncia. Enfim, na mais velha maneira de fazer política, o que decide as eleições no Brasil (além da grana da elite, e por isto mesmo) são os "grotões", os "currais" dos coronéis e oligarcas: os mais miseráveis, desorganizados, reduzidos à situação de "clientes". Ou seja, para realizar o seu projeto, o CM mudou a base social do partido. E não poderia ser diferente. Se alguns aspectos importantes da política de alianças que levou o partido à Presidência persistiram velados, a construção da governabilidade fez-se escancarada. Tendo escolhido chegar ao governo com um suposto programa democrático popular - declaração genérica de intenções que a " Carta aos brasileiros" de 2001 já desmentia in limine, agora é a corda bamba - e os resultados todos conhecemos. Quanto ao assunto da "privatização" dos fundos públicos pelo partido e/ou por alguns dos dirigentes do CM, apesar de gravíssimo, é ocioso discutir, se não se discute a estratégia. O problema está umbelicalmente ligado à estratégia escolhida: chegar ao governo no bojo do descenso das lutas populares e de trabalhadores, só é possível com a utilização das mesmas armas da velha política de sempre - métodos, ética e moral não existem autônomos. São parte inseparáveis do projeto e dos seus programas, e lhes imprime sua verdadeira "natureza". Ou seja: se o Terceiro Congresso do Partido dos Trabalhadores não for capaz de dar passos no sentido de um giro radical da sua estratégia, terá sido um rito vão, apenas uma legitimação do que vem sendo imposto há mais de duas décadas pelo CM, e cuja face agora se escancara. E, não esqueçamos: os dirigentes do CM são responsáveis por todas essas mudanças na rota do PT e, embora aparentemente incompetentes para conduzir o partido numa política de garantia de direitos e conquistas para a classe trabalhadora e seus aliado (o povo), têm se demonstrado extremamente talentosos e competentes para garantir, a partir desse instrumento que foi criado ma serviço dos interesses da classe trabalhadora, para implementar e consolidar reformas e políticas neoliberais. Certamente é essa vitória que cantam.
- Alipio Freire é membro do Conselho Editorial do Brasil de Fato, é jornalista e escritor; fundador do PT, ao qual permence filiado.

domingo, 26 de agosto de 2007

Isso é o que se pode chamar de "postes mijando em cachorros"...

Ainda não bem refeito do choque com a desonrosa atuação da Assembléia Legislativa do RS no caso das ações do Banrisul, que mediante manifestação de cidadãos contrários à proposta do executivo resolveram transferir a sessão para o "plenarinho", o que considerei uma grande insensibilidade de nossos deputados, deparei-mse com a seguinte notícia, publicada no Correio do Povo na quinta-feira, dia 23 desse mês:

Assembléia divulga lista sobre a invasão


O presidente da Assembléia, Frederico Antunes, entregou ontem ao secretário de Segurança, José Francisco Mallmann, o relatório da Procuradoria-Geral da Casa sobre a invasão do plenário em 14 de agosto. Ele solicitou que seja aberto processo de investigação baseado nas informações repassadas. O documento, fundamentado em levantamento do setor de segurança da Assembléia, apontou, entre os supostos incitadores dos manifestantes à desordem, os presidentes da CUT, Celso Woyciechwicz; do Cpers/Sindicato, Simone Goldschmidt; e do Sindicaixa, Roni Maslinkiewicz; o ex-presidente municipal do PT Francisco Vicente; e a diretora da Federação dos Bancários do RS, Denise Corrêa.

Correio do Povo Porto Alegre - RS - Brasil
Não sabia que seria possível, mas fiquei ainda mais apreensivo. Não bastasse a indiferença com que trataram uma manifestação legítima, de cidadãos organizados e que são contrários a essa manobra (que possivelmente resultará em privatização do Banrisul, mas no mínimo irá alterar o caráter de fomento social do banco), ainda tratam esses cidadãos como criminosos. Só mesmo nos novos tempos da república das pantalhas cidadania é considerada crime. O recado dos deputados é claro: "aqui, quem manda somos nós"; povo é só em eleições e para dar status de casa democrática. É bom lembrar que alguns hipócritas adoram referir-se à assembléia legislativa como "a casa do povo". Esquecem-se que são servidores públicos, e como tais devem todas as explicações ao povo. Caso contrário, é como se os postes estivessem mijando nos cachorros...